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quinta-feira, 4 de novembro de 2010


Estou perdido em uma tempestade de neve. O vento assobia, atirando pedacinhos de gelo que espetam os meus olhos. Vou cambaleando, os pés afundando em camadas daquela brancura fofa. Grito por socorro, mas o vento não deixa que os meus gritos sejam ouvidos. Caio e fico ofegando na neve, perdido naquela imensidão branca, com o lamento do vento soando em meus ouvidos. Vejo que a neve está apagando as minhas pegadas. “Agora sou um fantasma”, penso eu, “um fantasma sem pegadas”. Volto a gritar, com a esperança sumindo como as marcas dos meus passos. Desta vez, porém, há uma resposta longínqua. Protejo os olhos com as mãos e dou um jeito de me sentar. Além das cortinas flutuantes de neve, tenho a breve visão de algo se movendo, um borrão de cor. Uma forma familiar se materializa. Uma mão se estende em minha direção. Vejo profundos talhos paralelos cortando a sua palma e o sangue escorrendo, tingindo a neve. Seguro aquela mão e, de repente, a neve desaparece. Estamos em um campo de relva verde-clara e macios flocos de nuvens deslizam no céu. Olho para cima e vejo o céu claro coalhado de pipas verdes, amarelas, vermelhas, laranja. Elas cintilam à luz do entardecer.
(O caçador de pipas)